segunda-feira, 8 de março de 2010

Felizmente Há Luar

A peça Felizmente Há Luar, de Luís de Sttau Monteiro é fundamentalmente uma obra de reflexão sobre situações de repressão política, nomeadamente a da época da ditadura salazarista em que a obra é escrita. O tempo histórico representado é o da revolta liberal frustrada de 1817, tendo como figura principal o general Gomes Freire de Andrade; no entanto, a acção remete sistematicamente para a situação política dos anos 60 em Portugal, por um paralelismo de situações que a própria concepção de teatro torna impossível de ignorar pelo espectador.
De facto, a peça obedece a uma concepção de teatro épico, defendida por Brecht em oposição a um teatro de tipo aristotélico que levaria o espectador a identificar-se e a sofrer com as personagens; no teatro brechtiano, deveria ser produzido um efeito de distanciamento crítico que levasse o espectador a reflectir sobre as situações expostas e a relacioná-las com o seu próprio quotidiano. Para conseguir esse distanciamento, as falas das personagens de Felizmente Há Luar são construídas de forma a serem facilmente relacionadas com o momento da representação, sendo constantemente reforçadas, nas didascálias, por indicações cénicas ou de atitudes das personagens que intensificam essa relação; como exemplo, os monólogos de Manuel no início de cada acto, apresentando a situação do povo como uma constante histórica e sublinhados por indicações de gestos que alarguem essa situação aos próprios espectadores como se eles fossem também personagens da peça, ou o discurso de manutenção do poder e de bens materiais do Principal Sousa, reforçado por indicações cénicas de um vestuário luxuoso.
Assim, a obra funciona como uma alegoria em que os diversos grupos de personagens em jogo na peça representam estratos e grupos sociais da ditadura salazarista, colocando assim em cena a situação de miséria e repressão dos anos 60.

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